O prazo de validade de Cílio Souza

Se existe, ainda não foi (e parece que tão cedo não será) descoberto. Aos 40 anos, o avançado brasileiro conta com cerca de 300 jogos no currículo e já fez balançar as redes adversárias por mais de 150 vezes, mas mostra ainda estar longe de pensar no fim da carreira. Em Gouveia, no regresso do Beira-Mar ao convívio da Taça de Portugal, voltou a ser decisivo ao apontar o golo (e que golo!) que abriu uma inesperada goleada aurinegra, contra um adversário de escalão superior, por 4-0.

Força, aceleração, velocidade e impulsão. São atributos raros, em função da idade, que Cílio Souza teima em manter e me fazem questionar a cada jogo se há algum erro nas suas fichas biográficas. A sua menor agilidade em relação à década de 2000 confirma que não, o que comprova a impressionante longevidade de um ponta-de-lança que, verdade se diga, nunca foi o protótipo da fina linha que o Brasil nos habituou com Romário e Ronaldo como os maiores exemplos de entre aqueles que jogaram (e brilharam) em plena passagem de testemunho do século XX para o século XXI.

Com a veia goleadora ainda apurada (marcou 27 golos em 31 jogos, contribuindo para subida do Beira-Mar da II à I Distrital de Aveiro), uma preponderante voz de comando no balneário (mesmo sendo um homem de poucas palavras) e um extensor da ligação equipa-direcção-adeptos, torna-se difícil imaginar no jogador sem o futebol e o prazer de ter bola, e na equipa sem uma referência e o prazer de ter golo. Não o imaginam os adeptos, não o imaginam os poucos apaixonados pelo futebol que conseguirão guardar espaço mediático para seguir os aveirenses, e não o imagina a história do futebol português que terá obrigatoriamente que guardar umas linhas para o seu percurso, se não pelo Beira-Mar, pelo célebre golo por si apontado que valeu a eliminação do Benfica, na Luz, aos olhos do modesto Gondomar.

Este fim de semana, quando o Desportivo de Gouveia teve três ocasiões claras de golo nos primeiros 10 minutos de jogo e a intranquilidade da defensiva aurinegra fazia prever o pior, foi

Cílio Souza (um avançado) quem a conseguiu acalmar. Na primeira oportunidade para marcar, fez um golo que seria para ver e rever vezes e vezes sem conta nesta nova era das “boxes”. Eu, que estive no Estádio do Farvão, vi aquele “chapéu” executado à entrada da área (com o guarda-redes em pé) quando se pedia – e previa – ao finalizador que apenas encostasse a bola e por instantes passou-me um jogo de Liga dos Campeões à frente dos olhos.

Se Cílio voltou, aqui e ali, a aparecer nos jornais nacionais e a colorir frequentemente a imprensa aveirense, foi pela coragem e resiliência em ir aceitando terminar a carreira gradualmente nos relvados da Distrital (porque parar é morrer) até que a oportunidade surgisse, como surgiu, naquele que já considera ser o seu país: onde fez a sua vida e teve os seus filhos, entre eles um rapazinho que também já mostra dotes de goleador na formação. Mas desse poderemos (eventualmente) falar um dia.

SANDRO VELOSO (Planeta do Futebol)

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